Por Joel Pontin - 7 de agosto de 2023

Se queremos um projeto nacional de enfrentamento da ignorância financeira, finalmente temos uma ótima referência, indispensável. Refiro-me ao livro A psicologia financeira: lições atemporais sobre fortuna, ganância e felicidade*.

Capa do livro

Morgan Housel, jornalista especializado em finanças, ganhador de importantes prêmios, é o autor deste livro. Leitura fácil e agradável, lança luz sobre educação financeira e sua importância.

Todas as suas hipóteses e teses são fundamentadas em casos verídicos e vivências pessoais colhidas na sua trajetória profissional, referências bibliográficas e vida familiar. Seus ensinamentos vão muito além do senso comum raso sobre a importância do dinheiro. Dentre tantos pontos sensíveis tocados por Housel, destaco três, muito pertinentes num ensaio sobre psicologia financeira: a importância da independência financeira; a irracionalidade do mercado; e as dicas de especialistas. Confira:


Por que independência financeira é importante


Sou suspeito para expressar minha simpatia sobre o porquê, segundo Housel, é tão importante almejar a independência financeira. Em resumo, ele é taxativo em afirmar que esta independência é condicional para que você possa administrar o seu tempo.

Sim, a independência financeira te permite administrar o seu tempo em conformidade com suas prioridades e as prioridades da sua família. Também te permite recusar propostas que não agregam nada às razões da sua existência: a felicidade, a paz e a tranquilidade. Dito de outra forma, se o seu sustento ou de sua família depende umbilicalmente do valor recebido de outrem, então quem controla o seu tempo e disponibilidade é aquele que indiretamente paga as suas contas.

Veja o que Housel entende por independência financeira:

“Independência, para mim, não significa parar de trabalhar. Significa fazer apenas o trabalho de que se gosta, com pessoas de que se gosta, nas horas que se quer, pelo tempo que se quer.” (p.268)

Saliento que ele não cita em momento algum Aristóteles, para quem a felicidade é o bem mais desejado pelo ser humano.


A racionalidade do mercado irracional e a psicologia financeira


Parece haver uma espécie de consenso de que o mercado, os players, os investidores e até mesmo os especuladores operam orientados por uma racionalidade, por parâmetros fundamentalíssimos.

Não há dúvida de que muitos operadores tomam suas decisões lastreados em análises técnicas e nos fundamentos do ativo e do mercado. Eles existem, sim, e não são poucos. Também não são a maioria. Em geral são muito fortes e influentes.

A grande questão que o autor pondera é a seguinte: os investidores que se utilizam de estudos e análises costumam ser os primeiros a montarem estratégias específicas, e, se os resultados esperados começarem a aparecer, então, invariavelmente, o efeito manada é desencadeado.

Dito de outra forma, um imenso contingente de pessoas, players, investidores e operadores seguem o fluxo da manada, e, nestas horas, aqueles primeiros costumam se dar (muito) bem. Àqueles que permanecem naquele investimento, resta o consolo da torcida de conseguir boa rentabilidade. Estes esquecem que, nestas horas, torcida em nada influencia o resultado, apenas aumenta a angústia. Psicologia financeira na veia.


Você & eu: cuidado com as dicas financeiras de pessoas que jogam um jogo diferente do seu


A 16ª seção do livro poderia ter sido escrita por muitas pessoas que fazem a gestão financeira da sua casa ou negócio tentando obter os melhores retornos dos investimentos com o superávit das receitas sobre as despesas.

Sabe quando você se sente inseguro em tomar uma decisão e prefere seguir “dicas de especialistas”?  Por um bom tempo, nos primórdios da minha imersão no mundo das finanças, eu era um destes que seguiam quase às cegas as orientações dos “especialistas”, do gerente do banco, dos analistas grafistas e dos fundamentalistas das corretoras.

Resumo da ópera: minha performance começou a melhorar quando decidi, como regra, não seguir tais recomendações. Continuo acompanhando e analisando amiúde os fundamentos das dicas, especialmente as de vendas dos ativos que tenho em carteira. Mas daí a seguir as sugestões vai um longo e tenebroso percurso.

Housel foi preciso e exato ao recomendar muito cuidado com as dicas financeiras de pessoas que jogam um jogo diferente do seu. De imediato me veio à memória a recomendação de um assessor financeiro de uma instituição bancária que recomendou um plano de previdência privada para uma senhora de 78 anos que mantinha suas economias na poupança, um dinheiro que ajudava a pagar suas contas. E ela aceitou a recomendação. Por acaso esta senhora era minha mãe, idosa e com escolaridade básica. Nós, os filhos, só ficamos sabendo disso por ocasião do seu falecimento. Também descobrimos o malabarismo que ela fazia para pagar as contas, já que quase todos os seus recursos não podiam ser resgatados sem grande prejuízo. A minha sogra também teve a mesma orientação e precisou sacar o dinheiro aplicado rapidamente, arcando com um grande prejuízo.

A depender de quem está fazendo determinada recomendação, costumo avaliar com muita cautela e critério a possibilidade de me posicionar diametralmente oposto: se a recomendação é de compra, talvez seja a hora de vender; se estão recomendando venda, talvez seja a hora de comprar.

A lente de Housel foca um dos movimentos mais comuns e perigosos quando cita o embalo na compra ou venda de certos ativos (bens que têm um valor de mercado):

“Se um ativo pega embalo –vem subindo de forma consistente há algum tempo–, não é loucura que um grupo de traders de curto prazo presuma que ele continuará a subir. Não indefinidamente; apenas pelo curto período que eles precisam. Esse embalo atrai um volume razoável de investidores de curto prazo. E é aí que a coisa dispara.” (p.211)

E é aí também que mora o perigo. Ao disparar, aqueles que investiram por último naquele ativo correm um alto risco de serem pegos na contramão do efeito manada.    


Pós-escrito        


Não bastassem os diversos capítulos do livro que ajudam o leitor a entender melhor a dinâmica do mercado e de atores que nele atuam, o autor, em seu pós-escrito intitulado “Uma breve história sobre por que o consumidor americano pensa da forma que pensa”, faz um resumo interessantíssimo de diversos aspectos que explicam o comportamento de um norte-americano típico, como funciona sua psicologia financeira. Dá ênfase às políticas públicas no Pós-Guerra e também à evolução da internet e suas consequências. Uma delas é a eleição de Donald Trump. Vale a pena conferir.


Namaste!

Gassho!